A diluição das fronteiras, o liberalismo económico e as novas redes de comunicação à escala global transfiguraram o modo como é exercido o poder público um pouco por todo o mundo. Estes factores estão na base de novos modelos de organização social, nos quais entidades públicas e privadas de vária índole têm ganho progressiva autonomia face ao que dantes era um poder incontestável por parte do Estado. Esse poder, designadamente em espaços geopolíticos como o da União Europeia, é um poder cada vez mais contestado devido ao elevado estádio de desenvolvimento em que aqui se encontram os factores referidos. A União Europeia é, por isso, um espaço geográfico com maior tendência para o surgimento de centros de poder regional mais coesos e definidos.
Os cidadãos de uma Europa a vinte e sete, destinatários últimos das decisões comunitárias, são muitos deles o reflexo do distanciamento, do cepticismo e da passividade face ao papel que a União Europeia desempenha nas suas vidas. Esta descrença – em abono da verdade não poucas vezes motivada pela falta de informação – é uma das principais, se não a maior fraqueza da Europa contemporânea, e um dos seus maiores e mais prementes desafios. A solução encontrada passa, grosso modo, pelo reforço do método comunitário como via privilegiada para uma maior eficácia das decisões comunitárias. É inegável que a transposição de responsabilidades para um nível inferior, fazendo-as acompanhar por um maior grau de autonomia – necessariamente respeitador das especificidades regionais – é uma aposta segura e benéfica para o próprio futuro da Europa, pois garante uma cidadania mais plena, mais justa, e mais democrática.
Em 2004, com o acordo do Parlamento e do Conselho, a Comissão Europeia idealizou um novo instrumento jurídico de cooperação transfronteiriça sob a sigla AECT (Agrupamento Europeu de Cooperação Transfronteiriça). Aquele que se apresenta como o maior ponto de interesse do AECT é, sem dúvida, o facto de possuir personalidade jurídica própria. Na prática, isto significa que um AECT, quando constituído, pode agir em nome próprio e fazer-se representar autonomamente junto de outras entidades públicas ou privadas. Está dentro das competências de um AECT gerir programas de cooperação transfronteiriça financiados pelos fundos estruturais ou por outros fundos comunitários; todavia, um AECT pode também gerir e responsabilizar-se por programas que tenham sido da iniciativa de um ou mais Estados-membros, e financiados por estes e/ou pelas suas regiões. Esta característica garante a versatilidade deste instrumento, e alarga o âmbito da sua actividade. Espera-se que o AECT Galiza - Norte de Portugal venha a ser um estímulo para esta cada vez mais empobrecida região. O facto de contar com personalidade jurídica própria e com um elevado grau de autnomia é, teoricamente, uma mais-valia, que terá de se fazer repercutir na prática. Se não somos capazes de por nós mesmos fazer desenvolver esta região, que o façamos em conjunto com os senhores do lado de lá da fronteira. Pode ser que ao menos aqui Bruxelas tenha razão.
Sem comentários:
Enviar um comentário