sábado, 29 de novembro de 2008

Considerações Sobre Maquiavel (I).


Considerada uma das obras mais influentes e importantes da história do pensamento político ocidental, O Príncipe de Nicolau Maquiavel marcou indelevelmente uma forma de pensar e de estar na política. Devido ao seu hiper realismo e à sua visão egocêntrica do mundo, é por muitos considerada uma obra imoral e desprovida de escrúpulos, designadamente quando se trata de lidar com os assuntos do estado. Não obstante, o pensamento do “Secretário Florentino” reveste-se de uma originalidade singular no campo da Ciência Política, especialmente no que respeita à introdução de novas metodologias de investigação e análise, e ao desenvolvimento de conceitos-chave para esta mesma ciência. Inclusivamente, nas palavras de Freitas do Amaral, e como “o segundo grande politólogo da história”, é responsável pela autonomização dos fenómenos políticos em relação aos restantes fenómenos sociais; bem como pela tentativa de formulação das “leis da política”. Consequentemente, é também um dos responsáveis directos pelo nascimento de uma nova ciência.
A natureza d’O Príncipe é ímpar e muito distinta da de outras obras de filosofia política. Em suma, o livro é um “guia prático” de como alcançar e manter o poder nos vários tipos de principados oportunamente diferenciados pelo Florentino. Nas reflexões sobre a função da liberalidade na acção principesca, Maquiavel foi mais longe que os outros, não só descrevendo a realidade das lutas viscerais pelo poder tal como elas são, mas também incitando à prática de actos vis, cobardes e maléficos caso sejam necessários para o referido alcance e manutenção do poder – aliás fim único e último de toda a acção política. Aqui reside a verdadeira essência do badalado “maquiavelismo”, uma crença absoluta na perfídia inata da natureza do homem, desembocada numa necessária secundarização do papel da moralidade na política, se o objectivo passa por consolidar um posto como governante.
Maquiavel reserva, portanto, um lugar limitado para a liberalidade. Para defesa do realismo político, desdobra-se em considerações e exemplos práticos: “[O Príncipe] encontrará algo que parecerá ser virtude, mas que, se lhe obedecer, será a sua ruína, e algo que lhe parecerá ser vício, mas que, se lhe obedecer, lhe dará segurança e estabilidade.” A liberalidade não passa, assim, de uma das virtudes que pode levar à ruína do Príncipe. O que é virtuoso na moralidade é, na maior parte das vezes, um vício na política.
E é esta irredutibilidade que para mim, sem ofensa, é por demais deliciosa em Maquiavel. É reprovável o uso de práticas liberais apenas por incluírem contornos eticamente aplaudíveis. Afinal de contas, toda a realpolitik veio beber a Maquiavel. O mundo de hoje não lhe dá razão, no entender de uns. Mas outros negam veementemente que a política sirva exclusivamente o bem comum. Para mim, a natureza humana não deixa o Homem ir mais longe. Muitos podem dizer: mas há excepções. Sim, excepções. Não me levem a mal, mas a política, no seu significado mais empírico, é maquiavélica.

Sem comentários: