quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Ainda Marx.

Nem de propósito. Sem notar que o suplemento “Actual” do Expresso desta semana tinha Marx como tema de capa, postei no passado Domingo sobre a teoria geral do marxismo patente no Manifesto Comunista, sem todavia me aperceber que a obra faz este ano nada menos que 160 anos. As directrizes que conferiram a força motriz ao projecto comunista global encontram-se explanadas neste curto manifesto político, um texto que a todos os níveis se mostrou influente no modo como os partidos e organizações comunistas alicerçaram as suas acções durante a segunda metade do séc. XIX e no séc. XX. O rotundo falhanço da prática comunista - em abono da verdade da marxista-leninista - não esmoreceu a discussão sobre a validez do pensamento de Marx e Engels na era das democracias liberais e da globalização. Interessará pois menos tentar encontrar culpados para o desabamento do ideário marxista sobre si mesmo, do que tentar enquadrar Marx no espaço político-económico da realidade contemporânea. Aquilo que mais me chamou a atenção neste artigo da “Actual” foi precisamente o sublinhar da importância da “ideia crítica” do marxismo por parte do filósofo argelino Jacques Derrida, uma das suas dimensões actualmente mais valiosas:
Derrida designava assim uma actualidade de Marx, para além dos apelos ideológicos e ao «retorno de Marx»: invocando a «revolta», mas sem necessidade de uma organização do proletariado, ou de uma classe, nem muito menos de um partido; apelando à força crítica e analítica de Marx tanto no plano da acção política como na interrogação dos fantasmas, das mercadorias, da tecnologia, do trabalho imaterial, da globalização em curso e do aparelho mediático. E nomeava «dez pragas» da nova ordem mundial para propor uma «nova internacional» capaz de renovar e radicalizar a crítica ao estado do direito internacional. Uma aliança sem instituição, proposta por alguém que nunca acreditou no papel messiânico da união dos proletários de todos os países, nem na ditadura do proletariado – eis o que Derrida apresenta como resposta aos desafios da herança de Marx e como de fidelidade de um dos seus «espíritos». Ao mesmo tempo, Derrida denunciava a atitude que consiste em jogar Marx contra o marxismo e neutralizá-lo politicamente.
«Marx-renaissance» é simplesmente isto: não negar a abordagem crítica de Marx, mesmo – talvez sobretudo – no mundo actual, cravejado por processos capitalistas megalómanos, muitas sob uma capa falsa de justiça social. Sem ser marxista, e negando o seu insucesso empírico, é preciso contudo aproveitar a sua dimensão provocatória, a sua forma de questionar as relações sociais, e em especial (porque não dizê-lo), as relações entre capital e assalariado. Aproveitar a dimensão humana do marxismo, para amenizar algumas das consequências nefastas motivadas pela troca incomensurável de capitais, é uma necessidade dos nossos dias.
Pós-modernismo = pós-marxismo?

2 comentários:

Samuel Silva disse...

Agora é ao contrário do outro post sobre o Marx... A última frase não faz sentido, meu caro.
O Marxismo, a marx-renaisance ou o pós-marxismo, chamemos-lhe o que quisermos, é a melhor forma de contrariarmos essa voragem relativista, amoral e acrítica que é a pós-modernidade.

Quanto ao mais, inteiramente de acordo. Num momento em que o Capitalismo (neo-liberalismo?) dá mostras de falência, nada como voltar aos teóricos fundamentais para voltarmos a encontrar um rumo.

João Gil disse...

Boas. O que não faz sentido caríssimo? É verdade, quem diria? Eu a falar de Marx já viste? Mas porque não? Foi provavelmente a ideia política mais influente de...sempre. Eu gosto muito de Marx, aprecio a sua visão ideal do mundo e da sociedade, e, embora não me considere nem de perto nem de longe comunista, acho que também não é preciso para questionar a lógica actual do capital, a falta de regras que lhe ponham travão, os jogos de interesses, etc. Acho Marx hoje em dia bastante necessário, não nos seus moldes originais, mas nas possibilidades que oferece face a um mundo moderno, repleto de constantes e infindáveis transformações e intelectualmente cada vez mais intragável.