domingo, 14 de setembro de 2008

A Declaração de Intenções do Manifesto Comunista.


O Manifesto do Partido Comunista, cuja primeira edição data de 1848, é das obras mais emblemáticas de Marx e de Engels, e é considerado dos mais importantes e influentes trabalhos de teoria política jamais concebidos. É aqui que Marx procura discorrer sobre a verdadeira essência do comunismo, procurando esclarecê-lo em todas as suas dimensões e objectivos; de modo a que a sua doutrina – como os próprios autores fizeram questão de frisar – não continuasse exposta às maledicências e deturpações de que era alvo por parte da classe burguesa. Com este Manifesto, o comunismo assumiria inquestionavelmente, “perante o mundo inteiro, as suas concepções, os seus fins, as suas tendências.” O Manifesto, posto isto, é uma obra relativamente bastante curta, mas com elevado índice de objectividade acerca das principais teses comunistas, que giram essencialmente à volta de conceitos como os de luta de classes, exploração, burguesia, proletariado, capitalismo e revolução.
A obra demonstra desde logo o materialismo – ideia premente em Marx – e, portanto, uma ruptura com Hegel e Feuerbach. Para Marx, a primazia em filosofia não é da ideia, mas sim da realidade. A filosofia tem por isso de deixar de ser meramente especulativa, para passar a ser um instrumento para a transformação do mundo. Assim sendo, a filosofia deve acima de tudo preocupar-se com a interpretação do homem e das suas necessidades, bem como debruçar-se sobre realidades materiais. É por isto que Marx considera que são as condições materiais de existência que impõem à história um carácter eminentemente revolucionário. O homem é o principal sujeito da história, e a mesma foi, até ao surgimento do comunismo, composta por várias fases: pré-histórica, esclavagista, feudal e burguesa. A história tem sido uma continuação sistemática de relações dominador/dominado, mas sob condições e circunstâncias diferentes. O modo como a sociedade está estruturada, não permite às classes baixas almejarem qualquer modificação á sua condição de exploradas: o que dantes estava dividido entre patrícios e plebeus, ou entre barões e servos está hoje – na visão de Marx – dividido entre burguesia e proletariado. Foi, portanto, a organização do trabalho e os beneficiários desse mesmo trabalho, o critério escolhido por Marx para a sua famosa divisão da história. A luta de classes resume-se á luta pelo poder entre a classe dominante e a classe dominada: a classe dominante procura manter a posse dos meios de produção e o consequente usufruto do lucro proporcionado pelo labor da classe dominada, enquanto esta última luta pelo derrube total da primeira e pela implantação de um novo tipo de sociedade.
Marx usou a dialéctica para explicar a forma como as sociedades se sucedem no decurso da história. Simplificadamente, a dialéctica é a ciência da contradição e da antítese, defendendo que tudo gira à volta do seu oposto e da luta interminável e constante entre opostos. Quando as forças produtivas de uma sociedade ganham consciência de que a classe dominante já não é necessária, e/ou constitui um entrave ao progresso social, dão início ao processo revolucionário que a arredará do poder. Ou seja, uma sociedade era deposta após a classe oprimida ter explorado as suas contradições (Aufhebung). A isto, Marx juntou as concepções materialistas para descrever a sociedade como uma luta constante entre a sua base material e a sua base política e ideológica, entenda-se, entre a infra-estrutura e a super-estrutura.
Em relação ao surgimento do estado actual de sociedade, isto é, o capitalismo, Marx adianta que este surgiu “sob as ruínas da sociedade feudal”. Isto significa que o desenvolvimento das forças produtivas da burguesia foi suficiente para depor a aristocracia vigente no geral, e os senhores feudais em particular. O choque entre a super-estrutura e a infra-estrutura deu origem a uma alteração nas relações de produção: a classe burguesa passou a ser dona dos modos de produção. A constituição da burguesia em super-estrutura levou à formação de uma outra estrutura societal, onde se assiste à emergência da classe do proletariado – uma classe social que nada mais tem para vender do que a sua própria força de trabalho, a qual é vendida a um preço ridículo quando comparado com as mais-valias que a classe proprietária arrecada com o comércio daquilo que é produzido pelo proletariado.
Marx refere-se à burguesia como tendo “simplificado os antagonismos de classe”, sendo esse o factor que distingue a fase capitalista da história das restantes. Reconhecendo o seu empreendedorismo, Marx atribui á burguesia várias responsabilidades na alteração da estrutura social. Entre outras coisas, a burguesia foi responsável por aglomerar a população em grandes áreas, por centralizar os modos de produção e, mais importante, por concentrar o poder em poucas mãos; ao contrário do que existia anteriormente. É possível concluir, portanto, que os antagonismos na era capitalista são, para Marx e Engels, fáceis de identificar: a superação do capitalismo pelo comunismo será viável pela união dos proletários de todo o mundo contra a super-estrutura centralizada e dominada pela burguesia ávida de lucro. No imaginário marxista, a revolução comunista significaria o fim da luta de classes pela superação do próprio conceito de classe, bem como o fim da história. A formação de uma sociedade caracterizada pela distribuição igualitária dos bens e pelo livre desenvolvimento pessoal de cada um, e desprovida de qualquer hipocrisia capitalista, tornar-se-ia uma realidade.

Porque é que o ideário não se concretizou é outra história.

2 comentários:

Samuel Silva disse...

Quem diria que ia ler Marx no teu blog? ;)
A tua última frase diz tudo: o ideário não se concretizou. Nunca houve uma sociedade Marxista, apesar de todos os que falaram em nome dela. E, passadas as ondas de choque do fim da URSS e a confusão ideológica que esse regime trouxe, Marx ainda tem força para se assumir como uma inspiração política e social nos nossos dias.

Sílvia disse...

Finalmente tirei uns minutinhos para ver o blog do nosso Gil e para ler especificamente este post!

Nem parece meu mas desta vez estou inteiramente de acordo com a observação do Samuel... Principalmente a ultima parte que diz que a ideologia marxista continua a assumir-se como uma inspiração política e social nos dias de hoje! :)