domingo, 28 de setembro de 2008

McCain vs. Obama - Round 1.


Os dois candidatos à presidência dos Estados Unidos protagonizaram ontem no estado do Mississípi o primeiro de três debates, através dos quais se propõem convencer o eleitorado de que são o melhor homem para liderar os destinos da superpotência nos próximos quatro anos. Considerados dos momentos mais cruciais da campanha presidencial, os debates a dois são televisionados por milhões não só na América, mas por todo o mundo. É um acontecimento político de alcance global, visto, revisto e analisado ao pormenor por especialistas e politólogos dos quatro cantos do globo.
No frente-a-frente de ontem, os dois candidatos assumiram posturas distintas. Cada um por si procurou distanciar-se do estilo do outro, fazendo por fazer salientar o melhor possível as suas idiossincrasias e os seus trejeitos pessoais. McCain optou nitidamente por apelar à razão e ao coração do americano comum, do homem simples do meio rural e do tecido urbano médio, dando especial ênfase à sua vasta experiência política e militar. Obama decidiu-se por uma comunicação mais eloquente, mais enérgica que McCain, fazendo por trazer ao de cima questões que são caras ao partido Democrata, como o sistema de saúde e a energia. Em termos de estratégia comunicativa, creio que McCain levou a melhor. Soube espicaçar Obama quando necessário, soube manter a regularidade no tom de voz e apostou numa postura sólida e quase imóvel frente às câmaras, numa clara intenção de transmitir uma imagem de dureza e de sabedoria. E nunca olhou directamente para Obama nem quando falava nem quando escutava, como que tentando diminuir ao máximo as mensagens do seu oponente. Ao contrário de Obama, que fez contrastar com McCain um discurso menos fluído, mais intermitente; ao mesmo tempo que cometeu, quanto a mim, o crasso erro de dizer com mais regularidade do que o desejável “you are (absolutely) right John, but…” no início de várias frases. Obama não precisava de admitir, mesmo que por um breve instante, que McCain estava certo. Poderia simplesmente refutá-lo, como fez aliás o seu adversário. Obama conseguiu, ainda assim, recuperar alguma da fluidez no discurso à medida que o debate avançava, melhorando em relação ao que mostrou na parte inicial.
No capítulo das ideias, o debate dos candidatos à Casa Branca girou em torno de três grandes temas: impostos, política externa e segurança interna – estas duas de resto bastante interligadas. Ambos os candidatos centraram-se mais em desdizer o outro do que em apresentar propostas concretas, havendo ainda assim lugar a algumas questões fracturantes no que toca a assuntos muito concretos e que requerem solução urgente, sendo o caso mais paradigmático o Iraque.
Começando pela economia, ambos realçaram a necessidade de controlar com mais rigor a despesa pública e ambos prometeram ser inflexíveis nesse aspecto – isto sob uma chuva de acusações mútuas sobre quem no passado mais projectos gastadores aprovou. Até aqui nada de mais. A grande diferença surgiu quando Obama acusa McCain de querer cortar nos impostos às maiores empresas, ao passo que anuncia a intenção de cortar nos impostos de 95% das famílias. McCain, por seu lado, prefere cortar nos impostos das empresas para que haja a possibilidade de atrair mais investimento e, logo, criar mais emprego. Defende a necessidade de investimento em defesa para bem da segurança interna.
No que à dependência energética diz respeito, e ao contrário de Obama, McCain é peremptório ao defender a construção de novas centrais nucleares. Obama discorda lembrando que o mercado não resolve tudo por si mesmo, requerendo amiúde intervenção estatal. Estabelecendo prioridades, faz seguidamente a apologia das energias renováveis, da educação e da necessidade de mais obras públicas – assuntos, diga-se, apenas por ele referenciados.
Em matéria de política externa, McCain procurou estrategicamente assinalar a inexperiência de Obama e desacreditar as ideias deste. Obama, nesta fase já mais confiante e recomposto das hesitações iniciais, tentou colar a imagem de McCain à de Bush, dizendo-o mais do mesmo. Iraque, Afeganistão, Irão e Rússia dominaram as atenções em termos de política externa, sendo que nos dois primeiros McCain e Obama têm pontos de vista diferentes. Enquanto que o republicano defende a manutenção das duas frentes de batalha, o democrata defende – por motivos orçamentais e estratégicos – a retirada gradual e concertada das tropas do Iraque em 16 meses, e o reforço do contingente militar no Afeganistão, país que considera a principal ameaça aos Estados Unidos, fruto da forte presença da Al-Qaeda. McCain refuta esta ideia, argumentando que o Iraque é o principal desafio a enfrentar e que uma vitória final é possível. Diz o republicano que sem presença no Iraque, a actividade terrorista no Afeganistão aumentaria para níveis incontroláveis, sendo que tal significaria nada menos que a derrocada do esforço de guerra americano dispendido até aí. Faz referência aos soldados e às suas experiências pessoais nesses territórios, algo que, segundo ele, Obama nunca fez.



Quando inquiridos sobre a maneira de lidar com as intenções nucleares do Irão, McCain passa ao ataque afirmando que Obama era capaz de se sentar à mesa com gente como Ahmadinejad sem pré-condições, e tais práticas são ingénuas e perigosas. Recorre para tal a um perceptível humor irónico. Obama não aceita a acusação e refere que é preciso falar com todos, se tal significar mais segurança para os Estados Unidos, insistindo na diferença entre pré-condições e cooperação.
No caso da Rússia, a posição dos candidatos foi mais aproximada, defendendo ambos uma abordagem dura para com acções agressivas deste país, e colocando-se ao lado de países como a Geórgia e a Ucrânia, abrindo-lhes caminho para a inclusão na NATO. McCain esteve especialmente bem ao dizer que via a Rússia como um governo de ex-KGB’s.
Nas alegações finais, Obama dá mostras de pretender restaurar a confiança, entretanto perdida, do resto do mundo na América e nos seus valores, e de apostar em abordagens multilaterais como formas privilegiadas de resolver os problemas. Já McCain é mais pessoal e intimista, dirigindo-se uma vez mais ao homem comum e aos seus anseios e necessidades, tentando soar mais protector e paternalista que Obama.
No rescaldo deste confronto, creio que McCain conseguiu ganhar algo mais que Obama. Mesmo num debate pobre e pouco aguerrido, McCain soube gerir melhor o seu discurso e penso que o tom usado tenha soado bem aos ouvidos de muitos americanos indecisos. Obama triunfa sempre que chama Bush ao barulho, e tem de potenciar mais as ideias que verdadeiramente o distinguem de McCain: a saúde, as energias renováveis e a política social. Os próximos debates, em Nashville e Nova Iorque, terão forçosamente de ser mais assertivos quanto a alguns aspectos ainda pouco esclarecedores no programa de ambos os candidatos.
Por agora, as atenções viram-se para o debate de «vices», entre Joe Biden e Sarah Palin, no próximo dia 2 de Outubro.

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