segunda-feira, 29 de dezembro de 2008
Uma Metáfora à Vida.
domingo, 28 de dezembro de 2008
Comfortably Numb (1979).
sexta-feira, 26 de dezembro de 2008
2008 - Crónica de Um Ano Atípico.
Em primeiro lugar, a crise económica, depois financeira, depois económica e financeira. Contra as previsões mais optimistas para o crescimento da economia, a verdade é que o carácter marcadamente global desta crise parece ter abalado as fundições do sistema vigente desde a II Guerra Mundial. Caiu a máscara à ordem económica do pós-guerra. Muitos advogam não a morte do capitalismo, mas uma mais do que urgente reformulação deste. A palavra mais ouvida, a que faz qualquer adepto do liberalismo económico coçar-se, foi a mais ouvida em 2008 – a par, claro está, de “estagnação”, “recessão” ou “crise”: regulação. Regular os mercados, as instituições financeiras de crédito; regular o mercado habitacional, regular as trocas de capitais, regular as práticas obscuras de muitos gestores; regular e tornar mais transparente e credível o sistema financeiro, incentivar à poupança; e, acima de tudo, punir os responsáveis por danos irrecuperáveis causados a quem confia o seu dinheiro aos bancos. Para os que auguravam a morte do estado enquanto poder regulador, esta crise veio trocar completamente as voltas. Ao estado foi-lhe implorada a sua intervenção sob a forma de muitos zeros – vejamos se agora esse mesmo estado está em condições de se fazer pagar com a imposição de mais e melhores regras e, mais visível aos olhos do cidadão, com justiça.
Aproveitando o embalo de ideias como “estado” e “regulação”, destaque e honra seja feita à eleição do 44º Presidente dos EUA. Barack Obama, após uma transição que se afigura impecável, vai assumir as rédeas do (ainda) estado mais poderoso do mundo. Os EUA deixaram cair uma máscara que escondia a sua genuína identidade como povo democrático e tolerante. Do país que fez catapultar a crise económica, resta saber se vem também o antídoto. Obama inspira confiança, teve um discurso atractivo e eloquente durante a campanha mas será o motor da mudança necessária? Se os EUA não se assumirem como líderes de uma mudança anunciada, a sua posição no mundo estará definitivamente ameaçada. Não parece restar outro caminho ao novo Presidente que não um novo rumo para o seu país. O dia 5 de Novembro último pode ter sido o princípio de uma bela história. Ou não.
Um destaque final para uma questão intrinsecamente política e estratégica, que foi alvo de abrupta actualização em Agosto passado. Durante as Olimpíadas de Pequim, os olhos do mundo desviaram-se inesperadamente das piscinas e das pistas para o Cáucaso, região onde a Rússia fez questão de mostrar quem manda. Tal resposta seria impensável ainda há poucos anos. Enriquecida pelos petrorublos e dona de si como há muito não se via, o gigante russo marcou território e dissipou muitas dúvidas sobre a natureza do seu poder actual – centralizado, ambicioso, nacionalista e, pior, imperialista. Também a Rússia deixou cair a sua máscara para se tornar num dos mais sérios testes à União Europeia e aos EUA, ou por outras palavras, à unidade da UE (através da mais que duvidosa PESC) e à capacidade de influência dos EUA, respectivamente.
Venha 2009.
segunda-feira, 22 de dezembro de 2008
Retratando um Monstro.
sexta-feira, 19 de dezembro de 2008
A Evitável Queda do Tio Sam.
Para clarificar estas e outras dúvidas, Fareed Zakaria, homem reputado, doutor por Harvard e actual editor internacional da Newsweek, traz a público um livro bem oportuno. Bem escrito, dentro da simplicidade possível, sem floreados e repleto de exemplos ilustrativos, Zakaria traça o ponto da situação da conturbada distribuição de poder a nível mundial. O retrato, esse, é claro: os EUA, outrora intocáveis, estão a perder terreno face às potências emergentes do Oriente, não só económica mas sobretudo politicamente. China e Índia são por isso os mais vibrantes e elucidativos desafios estratégicos com que os EUA terão de lidar.
Contrariamente ao convencionado, os novos poderes, explica Zakaria, não representam ascensões políticas ou militares do tipo tradicional. São, isso sim, ascensões pautadas por uma diplomacia tranquila, nada quezilenta, preocupada com a vertente económica e em estender o seu braço comercial a toda a Ásia e depois ao resto do mundo. Se a China ou mesmo a Índia fossem uma ameaça do tipo da que representava a União Soviética, os EUA estariam preparados. No entanto, para este novo tipo de ascensão e de crescendo pacífico, os EUA não estão preparados e serão forçados a mudar radicalmente de estratégia.
Mas como? Nas suas palavras, já nem se pode falar em futuro: “o futuro já está aqui”. Os anos 90 habituaram mal os EUA, que se tornaram preguiçosos, arrogantes e presunçosos na arena internacional. A unipolaridade fez mal a um país, que na economia sempre se privilegiou e incentivou a concorrência, mas que em termos de política externa se habituou a agir sozinho, sem obstáculos ao seu poder. E isso complica a resposta que terá de dar.
De acordo com Zakaria, “Washington ainda não descobriu que o imperialismo diplomático é um luxo que já não pode sustentar”. Ainda assim, os EUA têm todas as condições para conservarem o seu poder dominante, embora já não hegemónico. Para tal, terão de fazer escolhas e não gastar recursos em zonas do mundo onde não tenham muitas hipóteses de levar a sua avante; deverão procurar ser o motor da criação de regras, práticas e valores para que o mundo se possa reger; devem manter melhores relações com as novas potências do que elas mantêm entre si; deverão fazer mais trocas e compromissos com outros países; devem pensar assimetricamente e não se deixar iludir por ameaças sobreavaliadas como o terrorismo islâmico; e devem, last but not least, actuar com mais legitimidade, a qual será necessariamente fonte de poder na nova era em que entramos.
domingo, 14 de dezembro de 2008
Quase Grandes.
domingo, 7 de dezembro de 2008
Considerações Sobre Maquiavel (II).
O Florentino oferece uma perspectiva económica do realismo político, mais concretamente, uma perspectiva de contenção de gastos. Uma estratégia de poupança valerá a fama de “somítico” ao Príncipe, uma fama que depressa se dissipará num momento de maior necessidade e aperto para o Estado. Em conformidade com o seu modo de pensar – não se pode hesitar em usar de quantos vícios quantos necessários – também aqui ser-se “somítico” é positivo e permite ao Príncipe não ser odiado e reinar em paz.
A liberalidade só pode ser admitida na acção política se para tal forem usados os bens dos outros, isto é, o resultado de pilhagens e saques de cidades conquistadas ou inimigas. A riqueza retirada destas investidas compensará portanto o referido vício de “somítico” do Príncipe, que, ao sê-lo, defende apenas o que é dele. O soberano não precisa de gastar o que é seu, visto que pode comprar o apoio dos seus soldados e súbditos com aquilo que é extorquido a outrem.
Maquiavel, como é sabido, considera a natureza humana negativa e, pior que tudo, imutável. O recurso a exemplos do passado constitui então prova fiel e sólida daquilo que pretende ilustrar. Se era verdade antes, também o é agora. Maquiavel prova assim o seu ponto de vista através dos exemplos de Júlio II e de Júlio César. É possível neste ponto definir um pouco mais da identidade ideal do Príncipe: um homem moldado pela “experiência histórica real”, que coloca os fins antes dos meios.
Maquiavel foi, conclui-se, pioneiro num modo muito específico de ver a realidade. De ver o “ser” em vez do “dever-ser”. Citando Viriato Soromenho Marques, o texto de Maquiavel “situa-se claramente na zona dos paradigmas clássicos da Realpolitik”, do qual o capítulo XVI constitui ilustrativo exemplo.
sábado, 29 de novembro de 2008
Considerações Sobre Maquiavel (I).
A natureza d’O Príncipe é ímpar e muito distinta da de outras obras de filosofia política. Em suma, o livro é um “guia prático” de como alcançar e manter o poder nos vários tipos de principados oportunamente diferenciados pelo Florentino. Nas reflexões sobre a função da liberalidade na acção principesca, Maquiavel foi mais longe que os outros, não só descrevendo a realidade das lutas viscerais pelo poder tal como elas são, mas também incitando à prática de actos vis, cobardes e maléficos caso sejam necessários para o referido alcance e manutenção do poder – aliás fim único e último de toda a acção política. Aqui reside a verdadeira essência do badalado “maquiavelismo”, uma crença absoluta na perfídia inata da natureza do homem, desembocada numa necessária secundarização do papel da moralidade na política, se o objectivo passa por consolidar um posto como governante.
Maquiavel reserva, portanto, um lugar limitado para a liberalidade. Para defesa do realismo político, desdobra-se em considerações e exemplos práticos: “[O Príncipe] encontrará algo que parecerá ser virtude, mas que, se lhe obedecer, será a sua ruína, e algo que lhe parecerá ser vício, mas que, se lhe obedecer, lhe dará segurança e estabilidade.” A liberalidade não passa, assim, de uma das virtudes que pode levar à ruína do Príncipe. O que é virtuoso na moralidade é, na maior parte das vezes, um vício na política.
quinta-feira, 27 de novembro de 2008
Смерть Ивана Ильича.
A descrição da Morte, como se não fosse preciso mais. Tolstoi traça um retrato envenenado da superficialidade da sociedade da época, tão terrível quanto actual. É uma sociedade que aliena o indivíduo, que por medo aceita, segue e promove os seus padrões de comportamento, sem questionar. Tudo na vida de Ivan Ilitch foi feito para agradar à norma, à convenção: o casamento, a casa e a decoração desta, o trabalho como meio e depois como fuga, as festas. Quão nefastamente deixamos de ser nós se assim for. Quão deturpada é uma vida que não se vive, apenas se existe.
Ivan Ilitch, ontem como hoje, é um revoltado. Como é possível que numa vida aparentemente tão longa, tão trabalhosa, tão cheia de escolhas e de caminhos, apenas a infância valha a pena? No seu leito de Morte, horrenda e incontornável, Ilitch recorda o sabor das ameixas que comia. E de novo parava na infância, e de novo era doloroso…Lindo.
terça-feira, 11 de novembro de 2008
Genial Apocalipse.
Roubar à Humanidade a faculdade de um dos seus sentidos conduz à destruição da sociedade sobre a qual construímos as nossas crenças e os nossos valores. Sob pano de fundo, está o desmoronar das instituições do Estado e de ordem pública, tornando a vida numa luta pela encarniçada e brutal pela sobrevivência, à espera de um futuro que faria à partida muito pouco sentido. É ler para crer. Saramago, com um premissa aparentemente simples, mergulha o mundo numa assustadora incerteza, que tem tanto de imaginária quanto de real: Até que ponto não andaremos todos cegos, mesmo vendo?
segunda-feira, 10 de novembro de 2008
Premiere - Página 56.
quarta-feira, 5 de novembro de 2008
Obama Para a Posteridade.
terça-feira, 4 de novembro de 2008
Venezuela's Wrong Path.
Given this, it is hard making a blind eye to the anti-liberal policies Mr. Chávez has been promoting since he came into office a decade ago. Political harassment have imprisoned the basic structures of the Venezuelan civil society, especially after the 2002 failed «coup d’état». Ever since the coup, Mr. Chávez and his counterparts have been justifying their unclear governance and radical political choices with the necessity of keeping a strong state, taking advantage of the 2002 event to diminish and persecute his opponents.
The expulsion of the HRW delegation is only a tiny example of the government’s disrespect for the principles of individual freedom, separation of powers and the rule of law. Some of the measures taken by Mr. Chávez are an unequivocal signal of his real long term intentions, mainly to extend his personal influence both to the public and private spheres of the country. First of all, Mr. Chávez has put his efforts on the approval of a new leftist Constitution, paving the way for more presidential power. However, the supposed “supreme law” of the country has proven to be easily handled by the presidency, and nothing or no one – even the Supreme Court – are able to stop this grotesque juxtaposition of powers.
Oil-rich Venezuela has sought, under Mr. Chávez’s presidency, to undermine the climate of stability and mutual understanding of the international community. He is using his country’s natural resources as a political weapon, pretty much alike his Russian homologous. It is widely recognized that Mr. Chávez stands his inflammatory rhetoric on the current high prices of oil and on the dependence of his importers. However, as recently noted by The Economist, Venezuela and its closest strategic partners “overlooked (…) a plunge in oil prices, and hence their own revenues.” Moreover, his economical policy is all but transparent, in which the forced nationalization of banks is only the most visible side.
It wouldn’t be unwise to affirm that Venezuela may have chosen the wrong path in becoming a centralized and undemocratic state, because as the future will certainly prove, the rule of law cannot be replaced by high oil revenues or by the arrogance of Mr. Chávez, who speaks as if he hadn’t a gagged opposition inside borders. ONG’s like HRW may have a very important role in denunciating these practices; and, at the same time, they might be able to act as an external voice for Venezuelan and other countries' imprisoned oppositions. HRW and other watchdogs like these must stand firm against disrespectful governments, promoting democracy and good governance wherever possible.
sexta-feira, 31 de outubro de 2008
O Lado Bom de Bush.
E não foi tudo mau. Pelo contrário, Bush incrementou as relações com a China e desenvolveu-as como nunca. Fez o mesmo com outras potências asiáticas como a Índia e o Japão, prosseguindo uma política de selective engagement própria da direita americana, que opta por ser menos abrangente nas alianças e afigura-se mais voltada para zonas estratégicas consideradas vitais para os interesses da América. Mesmo na relação com os aliados da NATO, é errado pensar-se que foi Bush quem contribuiu decisivamente para a deterioração das relações no seio dos membros da Aliança. Estas cisões advêm já da altura em que a NATO se viu envolvida em operações nos Balcãs, durante os anos 90.
Em termos de segurança interna, não é fora do contexto afirmar que os EUA estão mais seguros agora do que durante outras Administrações. E, não sendo seguro que o ódio aos Estados Unidos tenha aumentado em países potencialmente patrocinadores do terrorismo ou mesmo em países considerados aliados quando comparado com níveis anteriores, é crível dizer que a probabilidade de o seu território continental sofrer um atentado não é maior do que durante, por exemplo, a era Clinton. Até porque não foi durante os anos de Bush que foram planeados os ataques às Torres Gémeas e ao Pentágono a 11 de Setembro de 2001. Esta probabilidade exclui, obviamente, as forças militares estacionadas no estrangeiro.
Isto não faz varrer para debaixo do tapete os erros crassos de Bush, nem faz olvidar a penúria que foi o último mandato, quando esses mesmos erros eram já impossíveis de encobrir ou de justificar perante a comunidade de países livres. A intervenção no Iraque foi o caso mais flagrante de uma política fracassada no global, mas com pontos positivos pelo meio – basta pesquisar sem preconceitos e com olhos de ver.
quarta-feira, 29 de outubro de 2008
W.
Stone é maquiavélico. Não no sentido a que a palavra nos habituou, mas porque contra a vontade de muitos, não enxovalha Bush Jr., conferindo-lhe um retrato muito pouco político e muito mais biográfico. O que é perfeitamente compreensível: afinal, para quê calcar mais a figura de alguém que é calcado todos os dias? Bush Jr. será um homem livre daqui a um par de meses, e pouca gente percebeu quem é que realmente se esconde por detrás da máscara de Presidente dos EUA.
Bush Jr. é um tipo normal. Teve um pai importante, rico, influente, como alguns têm a sorte de ter. Foi um «rebel without a cause» durante os loucos anos da universidade. Gostava de beber uns copos, de dançar, de ser livre. É daquelas pessoas que toda a gente se imagina a rir alarvemente diante de várias cervejas.
Bush Jr. sofreu agruras em empregos por onde passou. Foi injustiçado em alguns aspectos da sua vida, especialmente no aspecto familiar, irremediavelmente tapado pelo irmão Jeb, preferido do pai. Teve de provar-se a ele mesmo que era capaz, e mais importante, de provar a outros que era capaz. E foi. Bush Jr. era mau em tudo por onde passou, mas não era mau na política – nela apostou tudo, contra a desconfiança do pai e da mãe, e ganhou. Ganhou algo aos 40 anos, depois de uma vida de completo fiasco é verdade – mas ganhou. Poucos acham que ele não teve de lutar por nada. Puro engano: não foi fácil descolar-se da imagem de “protegido”, e pior ainda de se distanciar da imagem do pai para conquistar algo por ser quem é, e não por ser filho de quem é. Bush Jr. é Bush Jr., não é Bush Sr.
E o homem tido por burro não é burro nenhum. É antes um bonacheirão, produto do meio rural americano, o qual cativou pela simplicidade, por meia dúzia de ideias-chave, e por uma perseverança e simplicidade de trato que a maioria dos americanos lhe reconheceu. Junte-se a isto o facto de Clinton ter caído em desgraça nos últimos tempos do mandato, e temos Presidente.
Bush Jr. foi capaz de sacudir obstáculos e acusações, e conseguiu ter sucesso sabendo pouco. Mas sabia pouco porque achou que não precisava de saber muito para chegar onde queria chegar.
Get ready to know the man.
quinta-feira, 23 de outubro de 2008
A Louca Paródia a McCain/Palin.
Paul Thomas Anderson: O Próximo Coppola?
A câmara de Thomas Anderson é crucial neste emaranhado de situações psicologicamente dramáticas. A precisão dos seus movimentos aliada à maneira como foca, por exemplo, o rosto dos personagens numa sincronia perfeita com o meio envolvente é, pode dizer-se, um dos mais significativos traços do cineasta californiano. E talvez a melhor cena para o demonstrar seja esta onde as personagens são focadas no seu espaço físico e psicológico mais íntimo, sem constrangimentos nem superficialidades - onde o papel da música (Wise Up de Aimee Mann) é particarmente importante. É um momento de rara beleza que perdurará certamente na memória de qualquer um. Esta cena tem de vir nos manuais de cinema.
sexta-feira, 17 de outubro de 2008
E Se Fosse Huckabee? (Obrigatório Ver o Vídeo).
quinta-feira, 16 de outubro de 2008
McCain vs. Obama - Round 3.
Já o republicano não conseguiu nunca, em nenhum momento da campanha, afastar-se o suficiente de George W. Bush. Havia feito até aqui uma campanha sem novidades de maior, cujo maior golpe mediático (chocante para alguns até) foi a escolha de Sarah Palin para vice. Escolha que não correu da melhor maneira a McCain, que após um período inicial de aprovação, cedo viu a sua “running-mate” revelar a sua verdadeira face, a qual, como é amplamente sabido, não agradou a quase ninguém. Ainda para mais tendo em conta que é no mínimo plausível pensar que as hipóteses de chegada à presidência do nº 2 de McCain, fosse ele (ela) qual fosse, são consideráveis. Portanto, tornava-se imperativo para o senador do Arizona puxar dos galões neste último debate e passar a ataque.
E foi isso mesmo que aconteceu. No palco da Universidade de Hofstra, em Hempstead, Nova Iorque, McCain começou e acabou o debate com uma chuva de críticas ao democrata, naquele que foi sem dúvida o mais intenso e vivido dos três debates a que tivemos oportunidade de assistir. Houve fases em que esteve melhor do que Obama, mais convincente, sabendo ser forte nas críticas sem ser paternalista, e sabendo ser duro sem ser ofensivo – dois erros crassos que McCain poderia ter cometido mas que não cometeu. Entrou de rompante, procurando colar a imagem de Obama ao aumento de impostos, ao passo que apregoava enfaticamente uma política económica centrada em descidas fiscais. Prometeu poupança acima de tudo, e fez tudo para se distanciar de Bush, estando particularmente bem quando interceptou Obama dizendo: “I am not President Bush. If you wanted to run against him you should have done it four years ago.”
Na área económica, Obama esteve ao seu estilo habitual. Sem arriscar – assim ditavam as sondagens – limitou-se a responder aos ataques de McCain, o mais calmamente possível, consolidando no eleitorado a sua a imagem de solidez e confiança. E creio que o conseguiu. Insistiu no redefinir de prioridades, defendendo a eliminação dos programas estatais que não funcionam em favor dos que funcionam e prometendo reduzir a carga fiscal a 95% das famílias. Nada de muito novo, portanto. No tema da campanha, o democrata tremeu um pouco face às investidas do republicano, que o acusou sucessivamente de interesses em certos sectores e de uma campanha obscura. Mas no final acabou por sair-se bem, ao colocar preto no branco as pessoas que o acompanharão à Casa Branca em caso de eleição.
Na pergunta sobre os respectivos “vices” (aqui em vídeo), Obama levou inequivocamente a melhor. McCain não soube atenuar a imagem de Palin, e não fez sobressair suficientemente bem as suas virtudes; ao passo que Obama elogiou Joe Biden eficazmente, tocando nos pontos essenciais da sua personalidade, ou seja, na sua especialidade, que é a política externa.
O debate prosseguiu com a discussão sobre energia e alterações climáticas, altura em que é difícil dizer quem esteve melhor. McCain saiu-se bem, provando não ter esquecido o tema, sendo peremptório na aposta no nuclear. Já Obama optou por um discurso cuidado mas revelador, focalizando-o na importância da energia limpa, a qual afirmou ser o motor da economia americana para o próximo século. E disse acreditar ser possível reduzir a factura petrolífera em dez/quinze anos anos - uma previsão mais realista do que a do republicano. Este é um dos pontos que jogam bastante a favor do democrata, e que o distingue bem de McCain. De resto, soube, na noite de ontem, defender-se a grande nível dos ataques do adversário, aos quais respondeu separadamente e com enorme à vontade – especialmente neste tema. McCain, por seu lado, já pouco tinha por onde pegar, voltando a dirigir-se em tom pessoal a uma pessoa em concreto durante o tema da saúde. Mas mais uma vez, Obama teve uma resposta à altura do republicano, ao declarar que os cuidados de saúde nos EUA devem começar por ser, antes de mais, preventivos.
O debate chegou ao fim com mais investidas de McCain, as quais em parte deram resultado. Obama teve um período menos bom, durante o qual não teve arte nem engenho suficientes para não deixar McCain ficar por cima. De qualquer forma, o candidato democrata equilibrou a contenda na parte intermediária, para não mais a deixar escapar. Resumindo, McCain esteve melhor do que no primeiro debate e muito melhor do que no segundo, mas Obama primou pela regularidade e rectidão no discurso, algo imensamente apreciado por todo o eleitorado. Por isso, e no conjunto dos debates, Obama levou a melhor por 2-1 – ainda por cima nos dois últimos, os que mais ficam gravados na memória.
Barack Obama, actual senador pelo estado do Illianois, 47 anos, é a minha aposta para próximo presidente dos Estados Unidos da América, numa eleição onde não só se decide o futuro do país, mas o futuro modelo sobre o qual assentará todo o sistema de relações internacionais para os próximos quatro (oito?) anos.
quarta-feira, 15 de outubro de 2008
"Prova d'Orchestra" de Federico Fellini.
Fellini traça magistralmente o retrato da relação amor-ódio (mais ódio do que amor) de uma banda para com o seu maestro. A acção ocorre num reduzido espaço, não superior a uma capela transformada em auditório, devido a uma alegada excelente acústica. O espaço revela-se um elemento primordial, porquanto permite articular finamente com a câmara a interacção estreita existente entre os risíveis personagens, fazendo sobre eles abater o seu insondável espectro. Mesmo em tão pouco tempo de filme, parece haver uma definição quase perfeita do carácter irrepetível de cada um dos elementos que compõem a banda, os mesmos que a lançam numa anárquica e contestatária avalanche de emoções e gestos irracionais. A emotividade acelerada da banda lança dúvidas sobre a exequibilidade da empreitada musical, e ainda mais da hierarquia e do respeito pelos quais por convenção se pautam este tipo de colectivos. A lição de Fellini surge então sob a forma de acalmia, depois da inesperada derrocada de uma das paredes da igreja, durante a qual a harpista sai ferida. Todos se apercebem da necessidade da ordem e da harmonia, que apenas podem ser trazidas pela direcção de um maestro competente e sério. O final é soberbo, com toda a orquestra a tocar sublimemente dentro de um conspurcado cenário de uma igreja parcialmente destruída. O binómio ordem/desordem numa melódica realização de Fellini.
segunda-feira, 13 de outubro de 2008
Estendam a Passadeira e Protejam-se.
Noel e Liam estão simplesmente a marimbar-se para rótulos. A música que lhes sai daqueles instrumentos é a que eles quiserem que saia, sem artifícios nem «corantes». À boa maneira Gallagher, quem quiser que ouça, quem não quiser não ouça. Quem achar que eles estão a fugir aos pergaminhos que vá dar uma volta ao bilhar grande, para não dizer pior.
Dig Out Your Soul sucede a um muito «morninho» Don’t Believe The Truth, e tendo em conta o que iam dizendo os manos, o que estaria para vir seria diferente. Diziam que não haveria hits, que não se admirariam se nenhuma das novas canções passasse na rádio. E de facto assim é (com a excepção da fabulosa The Shock of the Lightning). Mas não se apoquentem os mais cépticos. Dig Out Your Soul é um disco robusto, construído sobre sólidos alicerces. As quatro primeiras faixas são de fazer tremer as más-línguas, e colocarão um sorriso na cara aos mais desprevenidos. O álbum abre com Bag It Up, uma sumptuosa batida rock e segue com Turning, na minha opinião das melhores do disco. Elegante, belissimamente escrita ao melhor estilo dos Gallagher. Em Wainting for the Rapture já estamos a esfregar as mãos à espera de The Shock of the Lightning, mas apuramos e ouvido e deparamo-nos com uma enérgica guitarrada cheia de saborosas oscilações. Quanto ao “single”, é do melhor. Mais um hino que parece saído dos anos 90. Oasis clássico. Acreditem: só esta faz encher a barriga.
Depois do fartote, Dig Out… acalma. Só em Ain’t Got Nothin’ volta a haver barulho. Até lá, I’m Outta Time, (Get Off Your) Horse Lady e Falling Down são agradáveis «intrusos» cheios de pintarola. A primeira é um calmante para a alma que pede um fechar de olhos; a segunda pede um bater de pé para acompanhar o abrasivo ritmo imposto pela batida – tal como, diga-se, To Be Where There’s Life; já a terceira sobe de tom e é dominada por um som retorcido e misterioso – mais um exemplar de uma das veias criativas dos manos.
Para fechar em beleza, The Nature of Reality é uma marcha triunfal a rasgar tudo. Mais um dos momentos altos do álbum. Para fechar, um momento mais “cool”, talvez uma das facetas mais bem conseguias de Dig Out Your Soul. Soldier On é daquelas com que nos identificamos imediatamente e das que dá vontade de cantarolar baixinho.
E pronto. Eis Dig Out Your Soul, o melhor registo dos Oasis desde Morning Glory. Sentem-se melhorias em relação a Heathen Chemistry e a Don’t Believe the Truth. Neste está lá tudo. Tudo o que os Oasis podem fazer. Não estão descaracterizados, estão apenas uma década mais velhos. Mas desta vez deram um murro na mesa. Sejam bem regressados!
E agora com vossa licença, mas há uma certa The Shock of the Lightning para ouvir.
Oasis aqui na capa da Uncut de Stembro, o que atesta bem a atanção que imprensa da especialidade dedicou ao seu regresso. Menos não seria de esperar. Respeitinho é muito bonito.
sexta-feira, 10 de outubro de 2008
EndEUSada Canção.
Partido Socialista No Seu Melhor.
quarta-feira, 8 de outubro de 2008
McCain vs. Obama - Round 2.
E à segunda foi de vez. Barack Obama foi um claríssimo vencedor do debate que na madrugada de hoje opôs os candidatos democrata e republicano à chefia do (por enquanto) estado mais poderoso do mundo. O senador do Illianois partia para Nashville com uma pequena vantagem nas sondagens, vantagem todavia magra e possivelmente até enganadora, dado que muitos dos que responderam que preferiam Obama não confirmaram que votariam de facto. Já McCain via-se obrigado a correr atrás do prejuízo, mesmo após a boa performance tida no primeiro embate. Este segundo debate afigurava-se, portanto, fulcral para as aspirações do republicano. Nenhum dos dois se podia dar ao luxo de cometer qualquer gafe, nefastas numa altura em que campanha entra na sua fase decisiva.
O formato deste debate não favoreceu McCain. Ambos os candidatos passaram a maior parte do tempo de pé a responder a perguntas da plateia, e a perguntas colocadas pelo moderador, dentre as cerca de seis milhões que haviam sido enviadas via Internet. McCain fez contrastar o peso da sua idade com a jovialidade do seu adversário, pelo modo como andava com dificuldade no círculo preparado para o efeito. Por outro lado, McCain esteve quase sempre na sombra de Obama na questão económica (onde nenhum dos dois é especialista), e mais ainda na discussão sobre política externa. Num debate em que ambos procuraram reforçar as ideias transmitidas no primeiro debate, Obama soube contornar os ataques de McCain, os quais muitas vezes saíram de tom. Obama conseguiu também sacudir um argumento que McCain usou com frequência, relacionado com o facto de ter mais currículo do que ele. Disse várias vezes McCain: “Look at my record and look at his”.
Na questão económica, questão central no debate em virtude do recente abalo nos mercados financeiros internacionais, a confrontação verbal surgiu um pouco oca de conteúdos, mas teve algumas tiradas interessantes: McCain acusou Obama de ter responsabilidades na falência do Fannie Mae por via da sua acção no Congresso, ao passo que Obama acusou McCain de ir contra vários projectos lei que visavam o investimento em energias limpas, factor que o democrata considera essencial para uma recuperação económica dos EUA. Por outro lado, Obama insistiu e bem na importância de apurar responsabilidades ao mais alto nível por tudo o que tem acontecido nos mercados. McCain reforçava a ideia de credibilidade e de solidez que o próximo Presidente devia ter para enfrentar uma crise sem precedentes. Em suma, discursos vazios, mas dos quais se conclui que Obama esteve acima do seu rival, tanto pela fluidez do discurso como pela maneira como soube colar McCain a uma imagem de imobilismo e de passado. E esteve particularmente bem ao insistir regularmente que todos devem partilhar o fardo (”share the burden”), e não apenas alguns – algo que McCain não fez.
Em termos de prioridades, Obama soube também ser mais assertivo e convincente do que o republicano. Colocou, por esta ordem – e sem contornar a pergunta como fez McCain – a energia, o sistema de saúde e a educação como prioridades para o seu mandato. Defendeu a produção de energias limpas em solo americano, para evitar a sua compra ao estrangeiro; e prometeu fazer girar toda a economia à volta das novas energias limpas. Defendeu a redução de impostos para 95% dos americanos, e um favorável sistema de crédito para que as PME’s possam adquirir seguros de saúde para todos os seus funcionários. McCain foi forçado a ir atrás de Obama neste assunto e não esteve nunca à altura das propostas do democrata. Obama desacreditou McCain na questão dos seguros de saúde, argumentando que a procura de seguros de saúde fora do estado de residência promoveria a desregulação total do sector.
No concernente à política externa e de segurança, não houve grandes avanços nem grandes novidades; apenas o reforço daquilo que ambos haviam defendido no Mississípi. Para McCain a prioridade é o Iraque, para Obama é o Afeganistão. Mas o democrata esteve em grande quando afirmou claramente que os 10 biliões de dólares que os EUA gastam todos os meses no Iraque é dinheiro que o país precisa dentro de portas para pôr as pessoas a trabalhar. E foi capaz também de virar a acusação de McCain sobre o facto de ser mais experiente e mais talhado para a política externa, perguntando como é que alguém tão capaz falhou rotundamente ao apoiar a invasão do Iraque. De resto, não houve grandes novidades, dado que nenhum dos dois tem diferenças de fundo quanto a questões como a Rússia, Irão, ou quanto a intervir em casos de genocídio – em que ambos dão preferência à opção multilateral).
No final, vitória consensual para Obama, muito melhor do que no primeiro debate – contra um McCain que não fez jus à fama de dureza pela qual é conhecido, sendo excessivamente moderado, que foi algo que o descaracterizou aos olhos de quem o conhece e que estava à espera de ver o «verdadeiro» McCain. Será que senador do Arizona vai a tempo de emendar a mão? Não será nada fácil, tendo em conta que este debate consolidou Obama bem à sua frente. Seria preciso uma grande (ou várias) escorregadelas do seu rival para aumentar as suas hipóteses de eleição a um nível mais aceitável. Mas não é menos verdade que por esta altura, e depois de uma desastrosa governação republicana, qualquer candidato democrata já devia levar muita mais vantagem face a qualquer republicano, algo que não acontece. E este é dos poucos pontos que McCain pode ainda explorar. Seja como for, Barack Obama está mais perto da Casa Branca. Dia 15 há mais, em Nova Iorque.
sábado, 4 de outubro de 2008
Uma Grandiosa Notícia.
Valkyrie.
Por várias vezes Hitler havia sido alvo de tentativas de assassinato, mas nunca nenhuma delas ficou tão perto de se consumar. O acto co-planeado e pessoalmente executado por Stauffenberg consubstanciava as inquietações e a racionalidade de uma larga franja das elites política e militar da Alemanha, que via um monstro guiar uma nação e um povo inteiros para um desastre sem precedentes. O acto deste coronel foi um acto heróico, vindo de alguém com uma educação católica romana, com gosto pelas artes, pela filosofia, e de raízes aristocráticas. Stauffenberg, à semelhança de muitos outros silenciosos oficiais alemães, sentira-se atraído pelo nazismo numa primeira fase, mas não pactuava com as incontáveis atrocidades cometidas em nome da superioridade da raça ariana, nem com as decisões militares estrategicamente erradas que vinham sendo tomadas nas várias frentes de batalha. A ideia era pois fazer a paz separada com os Aliados, evitando males maiores e muitas mortes em vão para um país já desgastado para além do limite.
Por má colocação da mala ou pela via da resistência da mesa, o que é certo é que o golpe falhou. Mas o mito de Stauffenberg permanece vivo, bem como o fascinante significado do episódio da História que proporcionou. A não resignação aos poderes instalados e o dever de colocar os interesses do país e do povo acima dos interesses particulares, especialmente quando os destinos destes estão incondicionalmente entregues nas mãos de um louco. O episódio de 20 de Julho de 1944 faz repensar o movimento nazi e alimentar alguma especulação sobre os moldes em que penetrou nas mentes dos alemães, e a verdadeira extensão da sua aceitação dentro dos meios mais letrados da sociedade alemã, porventura não tão profunda como já se supôs. Repleto de “suspense” e drama, Valkyrie tem estreia prevista para 26 de Dezembro.
Aqui fica a muito interessente capa da Total Film de Outubro, que faz precisamente jus à figura de Tom Cruise em Valkyrie.